Uma final escrita por Franz Kafka

sábado, 10 de julho de 2010

KAUÊ DINIZ

É engraçado. Deveríamos lembrar com mais exatidão das nossas alegrias do que tristezas. Mas acho que, talvez, o ser humano para não querer errar novamente, tende a recordar daquelas cicatrizes que deixaram marcas profundas. E a final da Copa do Mundo de 1998 foi assim. Foi um tipo de Maracanaço, claro com suas devidas proporções, e devidas mesmo, do final do século XX.

Após passarmos pelo timaço da Holanda, nas semifinais, não havia quem duvidasse do pentacampeonato. Ronaldo estava na ponta dos cascos. Taffarel pegando tudo atrás. Tudo bem que nosso zagueiro era Júnior Baiano, já tinha até esquecido disso e é melhor deletar da memória novamente. Mas a Seleção se não era 100% qualidade, também não decepcionava com Bebeto, Rivaldo, Leonardo, César Sampaio, Roberto Carlos.

A França, sinceramente, não metia medo. Chegou cambaleante à final. Zidane, até então, não era o Zidane que hoje todos nós reverencíamos. Os Bleus tinham um ataque, formado por Guivarc e, às vezes, Dugarry, que, simplesmente não sabia fazer gol. Eram horríveis mesmo.

Por isso, fui assistir à final da Copa na casa de um amigo da época do colegial com a certeza de que o caneco era nosso. Mas logo ao chegar na casa dele, seu pai foi logo me informando: "olha, o Ronaldo parece que não vai jogar. Tão dizendo que quem vai entrar de titular é Edmundo". Era apenas a ponta de um iceberg que se tornou a traumática e tão discutida final de 98, que até hoje tem quem acredite piamente que os homens-forte do nosso futebol venderam nosso título.

A falta de informações precisas na ocasião, misturada à apatia de Ronaldo e toda a equipe dentro de campo, foram a cada minuto adormecendo as esperanças do pentacampeonato. O brilhante escritor tcheco Franz Kafka parecia ter renascido dos mortos para contar em formas surreais as últimas horas de um time moribundo. Um surrealismo explícito no gol de cabeça de Zidane. Pois é, como Sneijder, agora nesta Copa, o francês também jamais havia marcado um gol de cabeça.

Atônitos, acho que não só eu, mas a grande maioria dos brasileiros, até mesmo pelo exemplo da reação dos meus amigos presentes naquele "funeral", não tínhamos forças para reagir. Não houve xingamentos, nem lágrimas. Apito final, todos calados, fomos jogar ping-pong, como se nada houvesse acontecido.

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